terça-feira, 31 de março de 2015

Compartilho, logo existo


Em 1637, na busca de um conhecimento verdadeiro, o francês René Descartes (1596-1650), considerado o fundador da Filosofia Moderna, publicou a obra O Discurso do Método. A autobiografia apresenta textos inquietantes, onde atribui à humanidade a capacidade de compreender o mundo e estabelecer verdades. Para Descartes, a autenticidade de determinado fato deve ser aceita somente após uma profunda análise do fato, o que requer duvidar, questionar e rejeitar o incerto, e foi assim que o filósofo cunhou a famosa sentença “Penso, logo existo”.

Em pleno século XXI, O Discurso do Método renasce, como um presente para todos àqueles seres que vivem de por quês e por ques. Bem dito seja o Zequinha, o inquieto personagem do seriado infanto-juvenil Castelo Rá-Tim-Bum. O pequenote vivia com o ponto de interrogação na cabeça (?), cheio de por quês e por ques, mas tinha à sua volta amigos menos críticos que, com tantas certezas prontas, mesmo sem cunho científico, simplesmente respondiam: “Porque sim, Zequinha”. Ah, Marcelo Tas (Marcelo Tristão Athayde de Souza), como era bom quando você entrava em cena e dizia: “Porque sim não é resposta”. E lá estava eu, em frente à TV, aprendendo a questionar, aprendendo a duvidar, aprendendo a aprender. 


E hoje, você questiona seu mundo ou simplesmente aceita respostas prontas? Por quê? Por favor, porque sim não é resposta! 

Confesso que me senti entristecida quando assisti à campanha publicitária da cerveja Schin, que tem como garoto propaganda o ator Selton Mello. Vestido de branco (símbolo da paz), em comemoração à virada do ano, Selton aparece na primeira cena, com uma latinha de cerveja na mão e um roteiro feito para os seres não pensantes: “Ano novo, época perfeita para a Schin lançar o movimento para quem não curte ficar dando explicação para tudo, é o movimento do Porque Sim”.

Vamos lá: Selton, você protagonizou o filme o Palhaço, uma profunda reflexão sobre a contemporaneidade e o direito à felicidade. Em uma das cenas, você se pergunta: “Eu faço o povo rir, mas quem é que vai me fazer rir?”. Um curto texto, de singular profundidade e que, para obter a resposta ou respostas, necessitamos de muitos Por quês e Por ques. 
A Schin fez o seu papel, popularizar o seu produto e, de quebra, tentou minimizar as constantes críticas sobre a qualidade de sua cerveja. 


Se, para compreendermos o mundo necessitamos nos “afogar” no mar das incertezas, e ir além, em busca de fatos comprovados de forma sistêmica e racional, então precisamos refletir sobre o nosso papel na sociedade atual. Afinal, as tecnologias modernas, principalmente aquelas ligada à informação e comunicação, permitem o rápido acesso a diversos canais que, semelhantes a oráculos, têm respostas para tudo, ou quase tudo. São bilhões de pontos de vistas, e “cada ponto de vista é a vista de um ponto”.
Para se ter uma ideia, seja o que ocorre na internet em apenas um minuto:

Fonte: http://goo.gl/3H8NyA

Afinal, neste universo midiático, onde mora à sua criticidade?
Ao ler o texto acima, algumas pessoas dirão: “na minha época, eu tinha de pesquisar na biblioteca, passava horas e horas por lá, não era tudo fácil assim; hoje, está tudo pronto, é só copiar e colar, por isso os jovens não são críticos.”.
É interessante perceber o quanto algumas questões são simplesmente levadas para o senso comum. Caro leitor, na sua época, você passava sim horas e horas na biblioteca; à mesa em que você estava tinha livros, lápis, borracha, caneta, um caderno ou, para adiantar o trabalho, uma folha de almaço.  Para que...? Não raro, para copiar. Pergunto: quantos livros você tinha à disposição? Quantos autores? Qual a data da publicação mais recente? 
Hoje, nós temos acesso aos mais recentes artigos, livros, áudios, vídeos e sites para o compartilhamento de saberes, tudo à distância de alguns cliques. Mas, retomo a pergunta: onde mora a sua criticidade?

Vivemos um tempo em que a humanidade tem a seu dispor recursos para divulgar, compartilhar, empreender. Este é o novo mundo, interligado por fios, cabos, redes wi-fi, conectado por bilhões de computadores, smartphones, tablets. Você, eu, nossos amigos e parentes, não são mais meros espectadores passivos, simples leitores que consomem informações e, não raro, no universo escolar, obrigados a memorizar ideias de terceiros, sem ao menos ter o simples direito à crítica.
Pare um instante, acesse o seu Facebook, seu Linkedin, seu Twitter, seu WhatsApp. Quantos textos, quantos por quês e por ques você encontra nas interligações com seus amigos virtuais? Quantos compartilhar, quantos curtir? Aliás, basta publicarmos algo que já aguardamos ansiosos o aviso sonoro de nossos smartphones, e nos perguntamos: “Será que alguém já curtiu? Será que alguém compartilhou?”. 
Bem-vinda e bem-vindo a Era do compartilhar, a Era da autoria.
Descartes, para compreender o mundo à sua volta, deixou a escola, pois naquele universo não existia espaço para questionamentos e reflexões. O contato com as pessoas e suas verdades, foi fundamental para divulgar suas teorias e apresentar os textos de O Discurso do Método. Hoje, o mundo apequenou-se e as viagens de Descartes poderiam ser realizadas em sua própria residência, navegando pela web, ou se preferir, em qualquer outro local, pelo seu dispositivo móvel.
O livro Cibercultura, escrito pelo professor e filósofo Pierry Lévy, traz importantes argumentos a respeito da web e seu papel social e educativo. Segundo Lévy:
“O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem precisamente definido com antecedência. [...] agora devemos preferir a imagem em espaços de conhecimentos emergentes, abertos, contínuos, em fluxo, não lineares, se reorganizando de acordo com os objetivos ou os contextos, nos quais cada um ocupa posição singular e evolutiva.” (LÉVY, 1999, p. 158).
Assim, a web fortalece o diálogo, a troca entre os pares e entre pessoas não conhecidas. É possível criar, recriar, criticar, divulgar, conhecer, reformular. E, segundo Levy, não há linearidade nesta corrente de saberes, as pessoas ocupam seus espaços, de acordo com suas preferências. 
Onde mora a sua criticidade? Está dentro de você, na sua capacidade de questionar suas verdades, quando analisa e questiona; está fora de você, quando busca alternativas, quando percorre novos caminhos, quando conhece gente, de preferência, fora do seu contexto, fora do seu universo.
Se eu pudesse, somente em meus fantasiosos sonhos, teria os mesmos poderes do protagonista do seriado americano Pushing Daisies. O Jovem Ned tem o dom de trazer os mortos de volta à vida. Eu, devolveria à vida, Descartes (não me pergunte como acharia seus restos mortais). Mostraria a ele este novo mundo e perguntaria: “Quer se cadastrar nas redes sociais midiáticas? Aceita compartilhar seus saberes?”. Adoraria receber como resposta: “Compartilho, logo existo”.


Cíntia Acioli

terça-feira, 24 de março de 2015

Avaliação




A avaliação é um dos aspectos que compõem o processo educativo escolar, constituído por vários outros, como planejamento, conteúdos, recursos e estratégias. Há duas dimensões importantes que devem estar presentes no processo de avaliar: a ética e a técnica.
A palavra avaliação deveria soar como uma provocação, um convite a novas reflexões sobre um tema polêmico. Praticamente todas as crianças brasileiras estão matriculadas no Ensino Fundamental. Mas, qual é o cenário que temos? 
Sabemos que predomina uma realidade perversa. O fracasso escolar fere a autoestima do educando e impossibilita que ele avance na construção de conhecimentos relevantes para a sua vida em sociedade.
De quem é a culpa? Acredito ser da família, do sistema e da escola. É claro que a escola sozinha não conseguirá mudar esta realidade. Mas, se a escola cruzar os braços e se imobilizar, a sociedade perderá um de seus atores mais importantes para as transformações urgentes que precisam ser feitas.
É preciso pensar sobre os instrumentos de que a escola dispõe para empreender sua luta. Sendo a avaliação um deles, faz-se necessário redimensionar a sua prática no contexto escolar. Então, não só o aluno, mas o professor e todos os envolvidos na prática pedagógica podem, por meio da avaliação, refletir sobre sua própria evolução na construção do conhecimento.
O educador deve ter, portanto, um conhecimento mais aprofundado da realidade na qual vai atuar, para que o seu trabalho seja dinâmico, criativo e inovador. Assim, contribuirá para um sistema de avaliação mais justo, que não exclua o aluno do processo de ensino-aprendizagem, mas o inclua como um ser crítico, ativo e participante dos momentos de transformação da sociedade. 
"Seja pontual ou contínua, a avaliação só faz sentido quando leva ao desenvolvimento do educando", afirma Luckesi. 

Ana Cristina de Almeida
Psicóloga e Assessora Pedagógica

terça-feira, 17 de março de 2015

BULLYING: precisamos falar sobre isso.



Dia 09 de março morreu um adolescente de 14 anos após ser brutalmente espancado nas dependências de sua escola, em São Paulo. O motivo? Ele era filho de homossexuais e sofria bullying diariamente. Quantas crianças ainda precisarão passar por isso? Quantos ainda serão ridicularizados, espancados e/ou mortos por conta de sua condição sexual, de sua cor, de seu peso, de sua origem? O que as escolas têm feito para tratar do problema dentro de suas dependências, um espaço de socialização por natureza?
Apesar de ser uma palavra relativamente nova, o bullying vem ganhando espaço cada vez maior na mídia nacional e internacional. Ainda sem tradução no Brasil, o termo, de origem inglesa, se refere a comportamentos agressivos na escola. Os atos de violência física ou psicológica, praticados sistemática e intencionalmente têm por objetivo intimidar, humilhar, agredir, maltratar e amedrontar suas vítimas. Podem ser verbais (insultos, ofensas, apelidos pejorativos, etc), físicos e materiais (bater, empurrar, destruir ou roubar pertences), psicológicos e morais (humilhação, exclusão, chantagem, discriminação, intimidação, calúnia e difamação), sexuais (abuso, estupro, assédio, insinuação) e virtuais ou ciberbullying (internet, filmadoras, celulares, etc)¹.
Embora não haja um padrão de reações ao bullying, a Cartilha do Ministério da Justiça sobre o tema² aponta que os problemas mais comuns entre as vítimas são: desinteresse pela escola; problemas psicossomáticos; problemas comportamentais e psíquicos, como transtorno ou síndrome do pânico, depressão, anorexia e/ou bulimia, fobia escolar, fobia social, ansiedade generalizada, entre outros. Além disso, o bullying pode potencializar e agravar, em casos mais dramáticos, problemas preexistentes, como esquizofrenia, homicídio e suicídio, devido ao tempo de exposição prolongado ao estresse a que a vítima é submetida.
O fato de cada vez mais casos de bullying surgirem na mídia não significa necessariamente que os casos estejam aumentando. É possível que isso indique uma preocupação real em identificar, prevenir e erradicar esse fenômeno universal. Reprimir o bulliyng é uma medida provisória de resultados duvidosos e temporários, pois o problema não é resolvido, apenas abafado. É uma medida compensatória de curto alcance.
Apenas disseminando uma educação voltada aso valores humanos, à paz e à empatia, será possível combater o problema em sua raiz. É evidente que a família tem papel importante. Contudo, a escola deve ser protagonista, no sentido de alimentar uma educação em que o reconhecimento e o respeito sejam imperativos. Já fomos muito tolerantes com o bullying por anos e anos. Agora é o momento de interromper, com firmeza e determinação, sua vil trajetória.

¹ Fonte: Silva, Ana Beatriz Barbosa. Bullying. Cartilha 2010 - Projeto Justiça nas Escolas. Ministério da Justiça, Brasília: 2010.
² Idem.

Cássia Janeiro

terça-feira, 10 de março de 2015

O que é gestão?


O que é gestão? De modo simplificado, gestão é administrar recursos humanos e materiais da maneira mais assertiva possível, visando aproveitamento máximo destes recursos. Um sistema gestacional sistematiza práticas administrativas para atingir metas e alcançar resultados positivos. No mundo moderno, circunscrita na atual conjuntura de negócios, gestão é o que define sucesso ou fracasso. Tudo o que se refere ao âmbito administrativo orbita em torno da boa prática gerencial, que tem como pedra fundamental um conjunto de normas, princípios e funções. A gestão eficiente ou a má gestão se faz através do uso sistemático destes elementos norteadores. Muito se fala das políticas públicas no Brasil. É bastante comum, mais até do que o normal, as pessoas e a mídia apontarem várias falhas sistêmicas. Os meios de comunicação não se cansam de divulgar as mazelas sociais, de infraestrutura ou de natureza política. Filas em hospitais, mau funcionamento de serviços básicos, pouca qualidade nas obras públicas e um cem número de notícias sobre temas diversos que seria impossível listar. No final, tudo se resume a uma só coisa: gestão. Gestão é o que falta para melhorar a qualidade dos serviços. Não é necessário nada milagroso ou espetacular para o bom funcionamento das instituições. Se os recursos fossem geridos da maneira correta, os serviços mudariam de patamar: deixariam a mediocridade, ou apenas o padrão satisfatório, e saltariam para um platô de qualidade e excelência ideal. Na seara da educação, considero que os dirigentes operam quase que um milagre. O gestor que atua dentro da área educacional é criativo, proativo e pronto para tomar decisões que encontrem ecos naqueles que mais precisam: a população. O bom gestor na área da educação é aquele que administra para evitar desperdícios, para atender aos anseios de seus beneficiários e para extrair o máximo, mesmo diante das adversidades. 
O que é gestão na área educacional? É proporcionar mais do que o processo cognitivo de ensino/aprendizagem. É proporcionar bem-estar coletivo e disseminar o sentimento de que qualquer um pode ir mais longe.

Prof. João Artur Izzo